As redes sociais são plataformas para comunicação, para marketing, para busca de pertencimento e legitimidade do indivíduo/empresa que oferece imagem/sedução/ilusão e recebe visualizações e comentários como gratificação.
As conversas nessas redes tem sido, em muitos casos, vitrine para impor opiniões, exibir posses - corpos/paisagens/frases (feitas e de efeito), praticar violências, mentir...com estratégias (oferecidas pela rede) com passo a passo para ser bem sucedido nessas (não)interações.
Em tempos pandêmicos, as relações se intensificaram nessas redes, e muitas vidas já estão se tornando virtual.
O ponto não é a vida virtual que o meta está preparando para nós, mas o sentido, a qualidade, as experiências, os valores, que estão sendo praticados nesses ambientes, e pela amostra de como as redes tem sido usadas até então, tudo indica que mente e corpo caminham para um grande embotamento.
Sem dúvida existem movimentos inspiradores e importantes para a experiência da vida ocupando esses espaços, mas é curioso o quanto é observável que quando algo mais sensível é compartilhado, não recebe o retorno que as frivolidades recebem, mas isso só seria um problema para os que estão em busca de quantidade de likes, views e (não)interações, se o problema real não fosse a revelação do que move o mundo dos humanos.
Claro que isso não é de hoje pois assim tem sido a televisão com seus canais e programas populistas com muito mais audiência do que os programas mais elaborados. Mas hoje cada um pode ter seu próprio canal e programas e a surpresa foi ver pessoas que acreditávamos elegantes se revelarem em suas postagens apelativas.
Por outro lado existem as aversões, para mim, por exemplo, por mais que o assunto ou a pessoa seja interessante, se durante sua partilha tem o pedido mendigando para dar um like e para compartilhar, ou os truques baratos para induzir a comentar, ou se usam fórmula de lançamento, eu não consigo mais acompanhar.
É muito bom que a finalidade esteja tão exposta, mas é assustador que mesmo explicitada as intenções, as pessoas não se importam mais; alguém pode dizer claramente "estou mentindo pra vocês" que se a mentira for conveniente, ela é aceita.
Então surge a pergunta: Como comunicar algo significante e compartilhar usando as redes sociais?
Uma resposta possível é, Escutando.
Nós não somos escutados porque não sabemos escutar.
Uma escuta completa compreende o que está sendo dito, o que não está sendo dito, qual o convite que está sendo feito, qual ficção está sendo investida, que violência está sendo praticada; e perceber o que parece ser a verdadeira pandemia, uma carência afetiva na busca de aprovação a qualquer custo.
Esse modo de vida insustentável está exposto e está ruindo.
Esse modo de vida que está desmoronando pode abrir espaço para a reconexão com a vida, mas pode também destruir o ser humano e o mundo.
Não cabe mais a ilusão de que no final vai dar tudo certo, porque há muito tempo não está dando tudo certo.
Quanto antes desinvestirmos essa bolha insustentável, maior a possibilidade de reconexão e menos sofrimento.
Para que ainda nos serve esse vida ilusória inventada pelo ser humano que se coloca separado da natureza e de toda existência?
Para explicitar essa separação podemos pensar no ser humano como extrativista, como antropocêntrico, acreditando que o mundo é feito por ele e para ele; testemunhar reuniões de governantes discutindo qual o direito do planeta existir do seu modo natural, entre tantos exemplos cotidianos e normatizados por cada um de nós.
São perguntas que nos convidam a escutar e não a discorrer opiniões que são mera justificativas para validar o que sabemos que já não tem mais valor.
Em um mundo de seres que existem em relação onde estar em relação é risco de morte, tem algo muito importante sendo dito e que precisamos nos abrir para escutar.
Uma escuta profunda, confiante, responsável, que pode nos levar a transformar nossas vidas e a desinvestir tanto sofrimento.
Uma escuta que acontece silenciando.
Eis o paradoxo, uma escuta silenciosa para se comunicar.
Foto de Leandra Cardoso tirada durante o retiro de meditação no M.u.d.a. em 2019